DIÁRIO DE VIAGEM DO JORNALISTA NUNO FERREIRA (EX-EXPRESSO, EX-PÚBLICO) QUE ATRAVESSOU PORTUGAL A PÉ ENTRE FEVEREIRO DE 2008 E NOVEMBRO DE 2010. O BLOG INCLUI TODAS AS CRÓNICAS PUBLICADAS NA REVISTA "ÚNICA" EM 2008, BEM COMO AS QUE SÃO PUBLICADAS SEMANALMENTE NO SITE CAFÉ PORTUGAL. (Travel diaries of Nuno Ferreira, a portuguese journalist who crossed Portugal on foot from February 2008 to November 2010. contact: nunoferreira62@gmail.com ou nunocountry@gmail.com
27/10/08
DIÁRIO DE VIAGEM
Passei os últimos dias a descer e subir a serra, de Góis à Cabreira, por aldeias perdidas como Cadafaz e Colmeal, trepei ao concelho de Arganil por terrenos queimados até Cepos, onde pude apreciar os penedos do Fajão. Lá de cima até Arganil e aos pequenos confortos da civilização foi sempre a descer por Torrozelas e Folque. A caminho do concelho de Pampilhosa da Serra fiquei cada vez mais convencido de que dentro em pouco tempo a serra será um deserto, com aldeias muito bonitinhas de xisto para passar o fim de semana mas onde a vida rural se extinguiu há muito. Estou estacionado numa pensão perto da Barragem de Santa Luzia a pensar se devo subir já para a Estrela ou se ainda desço até à Gardunha.
I spent my last days descending and climbing the mountain, from Gois to Cabreira, from small and lost villages as Cadafaz or Colmeal. I climbed to Arganil county near burden territory, burden by fire till Cepos where I could enjoy the view, Fajão mountain on tne other side. From Cepos, till Arganil and the small conforts of civilization, I crossed Torozelas and Folque. On the way to Pampilhosa da Serra I understood clearly that soon portuguese mountain is going to become a desert, with beauty and touristic small villages where people from the cities go at the weekends but the countryside way of life dyed already. Well, I am now at Barragem of Santa Luzia wondering if I am going to climb Estrela mountain or if I descend towards Gardunha.
O DIA EM QUE A SERRA FICA PARA OS JAVALIS
“Partiu tudo, para a Alemanha, França, Lisboa. Qualquer dia já não vive aqui ninguém. Os velhitos morrem, nem plantarem milho conseguem que os javalis destroem tudo. Se alguém os for matar paga uma multa. Olhe, a serra fica para os javalis”, sentencia um homem da serra, que também já partiu, trabalhou numa “village” perto de Marselha, serviu na tasca de um irmão em Alfama.
A caminho de Fajão, concelho de Pampilhosa da Serra, atravesso várias aldeias fantasmas ou quase. Em Teixeira, duas mulheres cortavam erva que enfiavam em sacos de batata. Uma idosa transportava lenha à cabeça entre videiras amareladas. Estacou no cimo de umas escadas brancas: “Café? Bata aí que o senhor vem abrir o café!” Sirvo-me antes de uma fonte de água pura e sigo caminho junto ao rio Ceira, já não o Ceira melancólico e bucólico de Góis e da Cabreira mas um Ceira pedregoso e falso de montanha que só largo junto ao vale isolado de Cartamil.
A subida de quatro quilómetros até ao Fajão é suada e penosa, entre camiões que cruzam a serra para cima e para baixo rasgando-a com silvos que ecoam de encosta a encosta. Consigo chegar lá acima a tempo de almoçar no “Juiz do Fajão”, repleto de operários ruidosos, tudo gente que trabalha para as empresas das eólicas. A serra está entregue aos javalis e às eólicas. Durmo na antiga cadeia do Fajão, agora uma residencial em pedra de xisto. À noite, abro a janela e na noite gelada vejo as luzinhas vermelhas das ventoinhas piscando como pirilampos no recorte das serras. O som que vem dali é o de aviões a ressoar na distância.
No topo da serra, na ventania, um ou outro camião e eólicas cobrindo o dorso retorcido da montanha. Para baixo, em direcção à solitária Barragem de Santa Luzia, a vegetação que trepa até às fragas é desolada, hastes queimadas do que já foram árvores. De repente, lá em baixo, uma aldeia branca, o Vidual. A aproximação é quase sempre igual. Com sorte, escuto água a correr ou vozes de mulheres e crianças. Outras vezes, apenas um sino a cantar “a treze de Maio...”, uma galinha, uns cães que se esganam a ladrar de tanto puxarem as correntes que os prendem. Outras vezes, a presença humana resume-se a roupa a secar, um carro entre silvas numa curva, uma roulotte com matrícula inglesa de algum expatriado. Pois é, qualquer dia a serra fica só para os javalis e...as ventoinhas....
A caminho de Fajão, concelho de Pampilhosa da Serra, atravesso várias aldeias fantasmas ou quase. Em Teixeira, duas mulheres cortavam erva que enfiavam em sacos de batata. Uma idosa transportava lenha à cabeça entre videiras amareladas. Estacou no cimo de umas escadas brancas: “Café? Bata aí que o senhor vem abrir o café!” Sirvo-me antes de uma fonte de água pura e sigo caminho junto ao rio Ceira, já não o Ceira melancólico e bucólico de Góis e da Cabreira mas um Ceira pedregoso e falso de montanha que só largo junto ao vale isolado de Cartamil.
A subida de quatro quilómetros até ao Fajão é suada e penosa, entre camiões que cruzam a serra para cima e para baixo rasgando-a com silvos que ecoam de encosta a encosta. Consigo chegar lá acima a tempo de almoçar no “Juiz do Fajão”, repleto de operários ruidosos, tudo gente que trabalha para as empresas das eólicas. A serra está entregue aos javalis e às eólicas. Durmo na antiga cadeia do Fajão, agora uma residencial em pedra de xisto. À noite, abro a janela e na noite gelada vejo as luzinhas vermelhas das ventoinhas piscando como pirilampos no recorte das serras. O som que vem dali é o de aviões a ressoar na distância.
No topo da serra, na ventania, um ou outro camião e eólicas cobrindo o dorso retorcido da montanha. Para baixo, em direcção à solitária Barragem de Santa Luzia, a vegetação que trepa até às fragas é desolada, hastes queimadas do que já foram árvores. De repente, lá em baixo, uma aldeia branca, o Vidual. A aproximação é quase sempre igual. Com sorte, escuto água a correr ou vozes de mulheres e crianças. Outras vezes, apenas um sino a cantar “a treze de Maio...”, uma galinha, uns cães que se esganam a ladrar de tanto puxarem as correntes que os prendem. Outras vezes, a presença humana resume-se a roupa a secar, um carro entre silvas numa curva, uma roulotte com matrícula inglesa de algum expatriado. Pois é, qualquer dia a serra fica só para os javalis e...as ventoinhas....
FUNERAL NA SERRA
Um homem vestido com uma samarra escura passa por mim ainda eu tenho a vista presa ao Ceira iluminado pelo sol das duas da tarde que corre entre pastos verdejantes da Candosa. O homem ultrapassa-me em passos largos e caminhada de aldeão. Quando dou por ele já está a ler um papel branco com letras pretas. Depois, desaparece entre pinheiros e eucaliptos, para lá da curva. “Gostava de ter a pedalada dele”, penso. O papel anuncia o funeral de Manuel do Colmeal.
Quando chego à aldeia, uns três quilómetros adiante, já um magote de gente se vai juntando no largo perto de um café. “Lá se foi o Manel, era o seu destino...”, comenta um homem de suíças e popa à Elvis Presley vestindo um blusão preto de cabedal. “Chega a vez a todos, não é?”, diz a mulher que atende no café da terra. “Serve-me um copo”, diz o homem. “Tinto ou branco?” O homem das suíças acizentadas e grisalhas como cinza num rescaldo encolhe os ombros: “Tanto faz. Pobre do Manel. 'Inda era novo, não era?” A mulher, as mãos embrulhadas num casaco de malha, por cima do balcão: “Então não era...59 anos. Olha, este é que não teve sorte nenhuma na “bida”. Depois do primeiro acidente, disseram-lhe para parar de trabalhar. Continuou, teve o segundo acidente”. Um segundo homem entra no café, depois um terceiro, mais um quarto. “Não bebem nada?”, pergunta o homem das suíças grandes. “Pode ser um copito”, diz um. “Eu não posso, pode ser um sumo”, diz outro, muito magro, um homem jovem precocemente envelhecido, a pele seca e esticada no pescoço, os olhos avermelhados. “O segundo acidente foi de quê? Não caíu de um aindaime?” A mulher serve mais copos: “Olhem que vocês hoje têem de me ajudar, o patrão 'tá para o funeral e eu estou para aqui emprestada. As minis já sei que são 55...o copo de vinho? Trinta?”
Lá fora, uma multidão silenciosa de vultos negros cerca a Igreja branca erguida entre ciprestes no topo de um monte. Tudo o que se ouve no vale perdido na serra é o “vxxxxxhhhhh...” das eólicas pairando como fantasmas brancos sobre o Colmeal.
“É às quatro, não é?”, pergunta um homem encostado a um calendário com uma paisagem de uns picos de neve muito brancos e um vale muito verde. Por cima, há raposas, um esquilo e um mocho empalhados. Ao lado, uma lareira. “Se for o padre Xavier, é às quatro. Com ele, não há atrasos. Se fosse o padre Carlos...” A mulher sorri: “Ui, esse nem amanhã...” Está escrito que o funeral do Manel do Colmeal é uma oportunidade para os cada vez menos habitantes da serra se juntarem. Veio gente de Góis, do Cadafaz, de Cepos, da Cabreira. Todos conheciam o Manel. “Ele tinha invalidez e continuava a trabalhar...Não era homem de parar. Deixou para aí obras espalhadas...” Um aldeão não perde tempo: “Os filhos acabam-nas, “num” é? É para isso que servem os filhos”. A mulher ao balcão: “Eles são muito trabalhadores...” Até que alguém ganha coragem depois de mais um copo: “Afinal, de que morreu o Manel?” O Manuel, já andava mal do fígado e vesícula, terá falecido de um fulminante cancro no pâncreas. “Pobre Manel, foi o dia dele”.
Lá fora, o largo deserta. A serra encolhe-se de frio. Um a um, os homens vão saíndo. As mulheres há muito que estão na Igreja. O café esvazia. Só lá fica um idoso de bigode escuro, boina preta e olhos de raposa, as maçãs do rosto rosadas. “Eu já não tenho pernas para acompanhar o funeral, vou beber mais um copito. Coitado do Manel, este já não vai ao meu funeral. Dá-me lá mais um copito”.
Quando chego à aldeia, uns três quilómetros adiante, já um magote de gente se vai juntando no largo perto de um café. “Lá se foi o Manel, era o seu destino...”, comenta um homem de suíças e popa à Elvis Presley vestindo um blusão preto de cabedal. “Chega a vez a todos, não é?”, diz a mulher que atende no café da terra. “Serve-me um copo”, diz o homem. “Tinto ou branco?” O homem das suíças acizentadas e grisalhas como cinza num rescaldo encolhe os ombros: “Tanto faz. Pobre do Manel. 'Inda era novo, não era?” A mulher, as mãos embrulhadas num casaco de malha, por cima do balcão: “Então não era...59 anos. Olha, este é que não teve sorte nenhuma na “bida”. Depois do primeiro acidente, disseram-lhe para parar de trabalhar. Continuou, teve o segundo acidente”. Um segundo homem entra no café, depois um terceiro, mais um quarto. “Não bebem nada?”, pergunta o homem das suíças grandes. “Pode ser um copito”, diz um. “Eu não posso, pode ser um sumo”, diz outro, muito magro, um homem jovem precocemente envelhecido, a pele seca e esticada no pescoço, os olhos avermelhados. “O segundo acidente foi de quê? Não caíu de um aindaime?” A mulher serve mais copos: “Olhem que vocês hoje têem de me ajudar, o patrão 'tá para o funeral e eu estou para aqui emprestada. As minis já sei que são 55...o copo de vinho? Trinta?”
Lá fora, uma multidão silenciosa de vultos negros cerca a Igreja branca erguida entre ciprestes no topo de um monte. Tudo o que se ouve no vale perdido na serra é o “vxxxxxhhhhh...” das eólicas pairando como fantasmas brancos sobre o Colmeal.
“É às quatro, não é?”, pergunta um homem encostado a um calendário com uma paisagem de uns picos de neve muito brancos e um vale muito verde. Por cima, há raposas, um esquilo e um mocho empalhados. Ao lado, uma lareira. “Se for o padre Xavier, é às quatro. Com ele, não há atrasos. Se fosse o padre Carlos...” A mulher sorri: “Ui, esse nem amanhã...” Está escrito que o funeral do Manel do Colmeal é uma oportunidade para os cada vez menos habitantes da serra se juntarem. Veio gente de Góis, do Cadafaz, de Cepos, da Cabreira. Todos conheciam o Manel. “Ele tinha invalidez e continuava a trabalhar...Não era homem de parar. Deixou para aí obras espalhadas...” Um aldeão não perde tempo: “Os filhos acabam-nas, “num” é? É para isso que servem os filhos”. A mulher ao balcão: “Eles são muito trabalhadores...” Até que alguém ganha coragem depois de mais um copo: “Afinal, de que morreu o Manel?” O Manuel, já andava mal do fígado e vesícula, terá falecido de um fulminante cancro no pâncreas. “Pobre Manel, foi o dia dele”.
Lá fora, o largo deserta. A serra encolhe-se de frio. Um a um, os homens vão saíndo. As mulheres há muito que estão na Igreja. O café esvazia. Só lá fica um idoso de bigode escuro, boina preta e olhos de raposa, as maçãs do rosto rosadas. “Eu já não tenho pernas para acompanhar o funeral, vou beber mais um copito. Coitado do Manel, este já não vai ao meu funeral. Dá-me lá mais um copito”.
OUTUBRO EM GÓIS
O frio chegou de repente vindo dos penedos da Pena, varreu os camiões estacionados em frente aos restaurantes de estrada do Esporão, soprou pelo vale de Góis e trepou pela Cabreira em direcção a Arganil. Afugentou as gentes para dentro das lojas, arrastou folhas amarelas e avermelhadas, invólucros espinhosos de castanhas e a ramagem seca e outonal dos plátanos para o Ceira. Até os cardumes de peixes fugidios e pequeninos a correr atrás uns dos outros por entre as pedras pareciam querer fugir da súbita invernia. “Oh Dona Maria, faça-me um favor, feche-me essa porta”, pediu a dona da padaria, entre o quente aconchegante dos fornos e a rispidez gelada do vento entrando pela porta de madeira branca entreaberta.
Na serra, entre curvas de asfalto, as bermas cobertas de castanhas, um fumo branco de queimada ergueu-se no verde desfocado e triste da encosta contrária, mal se distinguindo entre o cinzento aborrecido do céu e a silhueta enevoada dos penedos de Góis. “Dão granizo para amanhã e neve para a Serra da Estrela”, diz um homem desocupado, de mãos nos bolsos, procurando conversa junto de outro a trabalhar uma latada. “Isto ainda não é nada”, responde o outro secamente, dirigindo-se para junto de uma pequena casa de xisto, a porta da garagem autenticada com a inscrição a branco “Garagem do Pirolito”.
Num dia de semana de Outubro, poucas pessoas se dão a ver na Cabreira. Uma avó cuida do neto e da filha na solidão do Café e Esplanada “Sonho da Juventude”. Uma idosa conversa com a vendedora de peixe que acaba de parar a carrinha na pequena praça da povoação. Dois homens consertam um algeroz junto ao restaurante “Tranca da Barriga”. Dois velhos espantam o frio sentados na tasca do taxista da Cabreira, que os ouve desfiar histórias requentadas e lentas à frente de dois copos de vinho a 30 cêntimos. “E eu ontem procurei-la, ela disse que ele 'teve um acidente mas que já saíu do hospital. Atão não era de vir falar co' a gente?” O segundo idoso, boina preta cobrindo a cabeça redonda e branca, esfrega demoradamente o queixo, depois o maxilar inferior como se acariciasse uma barba imaginária e aperta os beiços antes de levar o copo à boca: “Para quê? Ela não quer falar com vocês”.
A caminho da aldeia fantasma do Tarrastal, as copas de eucaliptos magrinhos chiam por cima da minha cabeça como baloiços. Soam vozes distante de homens e moto serras, algures perdidos na serrania. Um casal trabalha uma horta num vale perdido sem nunca dar pela minha presença. Umas botas de montanha repousam junto à porta de madeira de uma casa de xisto.
No Cadafaz, duas idosas irrompem de um beco conduzindo as últimas cabras da serra: “Está muito frio, sim senhor”, diz uma entre um sorriso envergonhado meio encoberto por uma manta de lã. A aldeia prolonga-se num casario que corre o topo da encosta de um lado ao outro, desemboca numa capela junto a um miradouro e segue pela Rua Doutor Oliveira Salazar, num misto de xisto e tijolo. Nos fundos da aldeia, espantando a solidão, um homem: “Tantas casas e tão poucas pessoas, não é? Vou p'ra dentro que está a ficar frescalhote”.
Na serra, entre curvas de asfalto, as bermas cobertas de castanhas, um fumo branco de queimada ergueu-se no verde desfocado e triste da encosta contrária, mal se distinguindo entre o cinzento aborrecido do céu e a silhueta enevoada dos penedos de Góis. “Dão granizo para amanhã e neve para a Serra da Estrela”, diz um homem desocupado, de mãos nos bolsos, procurando conversa junto de outro a trabalhar uma latada. “Isto ainda não é nada”, responde o outro secamente, dirigindo-se para junto de uma pequena casa de xisto, a porta da garagem autenticada com a inscrição a branco “Garagem do Pirolito”.
Num dia de semana de Outubro, poucas pessoas se dão a ver na Cabreira. Uma avó cuida do neto e da filha na solidão do Café e Esplanada “Sonho da Juventude”. Uma idosa conversa com a vendedora de peixe que acaba de parar a carrinha na pequena praça da povoação. Dois homens consertam um algeroz junto ao restaurante “Tranca da Barriga”. Dois velhos espantam o frio sentados na tasca do taxista da Cabreira, que os ouve desfiar histórias requentadas e lentas à frente de dois copos de vinho a 30 cêntimos. “E eu ontem procurei-la, ela disse que ele 'teve um acidente mas que já saíu do hospital. Atão não era de vir falar co' a gente?” O segundo idoso, boina preta cobrindo a cabeça redonda e branca, esfrega demoradamente o queixo, depois o maxilar inferior como se acariciasse uma barba imaginária e aperta os beiços antes de levar o copo à boca: “Para quê? Ela não quer falar com vocês”.
A caminho da aldeia fantasma do Tarrastal, as copas de eucaliptos magrinhos chiam por cima da minha cabeça como baloiços. Soam vozes distante de homens e moto serras, algures perdidos na serrania. Um casal trabalha uma horta num vale perdido sem nunca dar pela minha presença. Umas botas de montanha repousam junto à porta de madeira de uma casa de xisto.
No Cadafaz, duas idosas irrompem de um beco conduzindo as últimas cabras da serra: “Está muito frio, sim senhor”, diz uma entre um sorriso envergonhado meio encoberto por uma manta de lã. A aldeia prolonga-se num casario que corre o topo da encosta de um lado ao outro, desemboca numa capela junto a um miradouro e segue pela Rua Doutor Oliveira Salazar, num misto de xisto e tijolo. Nos fundos da aldeia, espantando a solidão, um homem: “Tantas casas e tão poucas pessoas, não é? Vou p'ra dentro que está a ficar frescalhote”.
JESUS NUM MONTE ISOLADO EM CARATÃO (ARGANIL)
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