DIÁRIO DE VIAGEM DO JORNALISTA NUNO FERREIRA (EX-EXPRESSO, EX-PÚBLICO) QUE ATRAVESSOU PORTUGAL A PÉ ENTRE FEVEREIRO DE 2008 E NOVEMBRO DE 2010. O BLOG INCLUI TODAS AS CRÓNICAS PUBLICADAS NA REVISTA "ÚNICA" EM 2008, BEM COMO AS QUE SÃO PUBLICADAS SEMANALMENTE NO SITE CAFÉ PORTUGAL. (Travel diaries of Nuno Ferreira, a portuguese journalist who crossed Portugal on foot from February 2008 to November 2010. contact: nunoferreira62@gmail.com ou nunocountry@gmail.com

02/12/08

DIÁRIO DE VIAGEM (TRAVEL DIARIES)

 
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Well, in the middle of July, near Belver and Mação, close to Tagus River, I got 40 degrees Celsius. Now, I feel blessed by all this snow anusual in a country as Portugal. Since I started climbing Serra da Estrela mountain, I got tired of listening people talking about those big snow falls times, many years ago. They would say allways the same: "Oh, it doesn't snow for years". On a cold wednesday I heard a village woman: "It's going to snow!" I thought she was kidding. No, She was right. Friday night snow started falling and kept some mountain villages isolated for days.

Em Julho, pelas bandas de Belver e Mação, levei com 40 graus, de modo que foi para mim uma honra ser abençoado com tanta neve em Linhares. Desde que começara a trepar a serra a partir da Covilhã,ouvira sempre falar nos tempos em que nevava muito. A cantiga era sempre a mesma, fosse em Manteigas ou em Folgosinho: "Aqui há uns anos que não neva". Numa quarta-feira muito fria, em Folgosinho, achei estranho uma senhora comentar: "Ainda vai caír um nevão". Achei tudo aquilo muito irrealista. Cheguei a Linhares na quinta-feira sob frio e algum gelo na estrada mas nada de neve. Nada fazia prever este manancial branco que caíu a partir de sexta à noite. Gostei!

NO SILÊNCIO BRANCO

 
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A velha senhora apareceu do nada, daquelas ruelas de pedra com muita História, que em Linhares tudo respira passado e aristocracia. Acabara de trepar ao castelo para ver até onde chegava a neve. Desde sábado que neva como há muito não nevava. Nesse dia, Linhares acordou com neve pelo joelho. “Até o padeiro não veio, a ver se aparece hoje que estou a ficar sem pão”, soltou, muito embrulhada num xaile de lã, arrepiada com o frio. Daí a pouco, saído de uma travessa, lá veio a carrinha branca do pão. “Não vim? Vim pois, você é que não me viu...vim por Cortiçô e depois subi, 'tava dificil mas vim até cá acima”, resmunga o padeiro, que ainda tem muitas voltas para dar no rosário de aldeias que povoam a encosta naquele canto norte da Serra da Estrela.
Hoje a neve já derreteu, há turistas a saír rápidamente de jeeps e carros, acasacados, à procura de uma foto com neve e de um café aberto. A aldeia encolhe-se, os poucos habitantes são quase todos idosos e estão cansados de frio e do branco da neve. Ali mais a baixo, na quota dos 600 metros, há gente a aproveitar o feriado para apanhar a azeitona. “Hoje já varejei duas oliveiras, até já tenho um lenho aqui no dedo. É aproveitar enquanto não chove nem neva para dar conta dela. Este ano hei-de apanhar uns mil e tal quilos...”, contou-me um aldeão de Cortiçô.
Em Linhares, há pouco ou nada para gastar o tempo. “Oh, isso antigamente, chegavamos a ficar oito dias isolados. Era cada nevão. Olhe, adeus que tenho frio, vou para perto da lareira, não se consegue estar na rua”. Uma mãe e uma filha correm a refugiar-se num café mas antes de entrar ficam especadas a olhar para mim e a minha mochila: “Oh mãe, aquele homem vai subir a serra?” A mãe faz que sim abanando os cabelos aloirados e diz: “Anda, vamos para dentro”. Para as bandas mais altas de Folgosinho e em todo o itinerário que fiz há dias, a neve pinta a montanha, cobre de branco o que é verde e negro. Um cão serra da estrela ladra furiosamente mas como quase sempre com os serra da estrela acaba por se aproximar e deixar que lhe faça umas festas.
Enveredo por um caminho de terra batida. A princípio a neve brinca ao esconde esconde com pedaços de terra e pedra. À medida que se sobe, os pés são obrigados a caminhar com mais atenção. Sigo as marcas de uns pneus, depois sigo as pegadas de alguém que ainda se aventurou serra acima. Mais tarde, sigo pegadas de um animal, um cão, provavelmente. A determinada altura, as pegadas terminam, os ténis enterram-se na neve- preciso de comprar umas botas de cano alto- e começa a sinfonia de branco: pinheiros raquíticos as hastes brancas acumulando neve; carvalhos pintalgados de branco; fragas de negro e branco. E acima de tudo, aquele silêncio branco. Muito de vez em quando, um revoar de nuvem abre uma aberta e sou autorizado a contemplar a montanha. São breves segundos aos quais se sucede o mesmo cobertor de nevoeiro abatendo-se sobre a neve, a serra, as pedras, os pinheiros, as ervas. É o silêncio branco. A 1200 metros de altitude, junto ao local onde funciona um clube de parapente, tenho esse sonho branco e mágico só para mim. Tudo o que mexe é uma corrente de água que não gelou numa fonte coberta de neve. Quando regresso a Linhares pela estrada de asfalto, foi como se tivesse saído de um filme a branco, de um sonho algures na Finlândia. Mostro, encantado, as fotos ao aldeão das oliveiras: “Ah sim, a neve para quem nunca viu é bonito. Quer-me ver a varejar as oliveiras? 'Tá lá a minha mulher, a minha filha, tem que ser, todos precisam de ajudar”.
 
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Neve a 1200 metros de altitude
 
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LINHARES

 
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Aqui foi quando larguei o caminho de terra batida, nesse dia caminho de neve batida e cheguei ao asfalto, já perto da zona onde fazem parapente

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sinfonia de branco, poesia pura
 
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A minha Berg, que me acompanha desde Sagres. Noutro dia interrompi a travessia para vir a Lisboa e apanhei um autocarro em Celorico da Beira. Em Viseu, mudámos de camioneta. Em Coimbra, parámos na central de camionagem, corri para a casa de banho. Quando regressei, a camioneta já tinha partido com a minha querida mochila lá dentro. Apanhei outra camioneta, uns 30 minutos mais tarde. Cheguei a Sete Rios, dirigi-me aos perdidos e achados, lá estava ela acabadinha de chegar. Acho que lhe devia dar um nome, de preferência feminino mas não sei qual.

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LINHARES

 
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No Verão deve ser um local bem agradável para organizar um piquenique
 
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De vez em quando uma pequena aberta entre as nuvens permitia ver a serra para as bandas de Folgosinho
 
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Este é o caminho em que enveredei para chegar ao topo

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Muito perto de Linhares

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Pegadas na neve, efémeras
 
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LINHARES

 
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Lá chegou o padeiro a Linhares
 
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