DIÁRIO DE VIAGEM DO JORNALISTA NUNO FERREIRA (EX-EXPRESSO, EX-PÚBLICO) QUE ATRAVESSOU PORTUGAL A PÉ ENTRE FEVEREIRO DE 2008 E NOVEMBRO DE 2010. O BLOG INCLUI TODAS AS CRÓNICAS PUBLICADAS NA REVISTA "ÚNICA" EM 2008, BEM COMO AS QUE SÃO PUBLICADAS SEMANALMENTE NO SITE CAFÉ PORTUGAL. (Travel diaries of Nuno Ferreira, a portuguese journalist who crossed Portugal on foot from February 2008 to November 2010. contact: nunoferreira62@gmail.com ou nunocountry@gmail.com

29/05/10

CRÓNICA PUBLICADA NO CAFÉ PORTUGAL (CLICAR PARA LER NO SITE)

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O caminho desce por entre tons verdes, amarelos e arroxeados dos campos do Barroso. Ao longe, o altifalante de um aldeia canta “ave, ave”. Passo por mulheres protegidas do calor por chapéus de palha, guiando pequenas manadas de vacas barrosãs, parando num bebedouro e conversando enquanto estas bebem. Um homem pesca junto ao perfil ainda esguio do Cávado, antes da primeira represa. Regresso à estrada em Fiães do Rio. Uma idosa vestida de negro indica-me a direcção de Paradela. Ultrapasso uma escola primária abandonada, vidros partidos, o quadro de lousa ainda intacto, uma descida, uma quantas casas de estores fechados.
De repente, após uma curva, surge-me o lençol azul da Barragem da Paradela cercado pelo perfil rugoso e imponente do Gerês. É uma parede de pedra que se estende irregular e contorcida tapando todo o horizonte, como que dizendo: “Aqui não passas”. 410
Dali até, pelo menos as Minas dos Carris, é território perigoso, sem trilhos, onde aventureiros arriscam a passagem para dor de cabeça de pessoas como José Carlos Moura, 28 anos. Encontrei José Carlos na aldeia vizinha de Paredes do Rio. Desde criança que explora a montanha, a baixa mas traiçoeira montanha do Gerês. “Aquilo ali é um mini Picos da Europa, só que nos Picos da Europa há trilhos e ali não, só há as mariolas (marcas em pedra deixadas pelos pastores) para nos guiarmos.
José integrou uma equipa de bombeiros de Montalegre que em Fevereiro de 2008 se teve de fazer à montanha em condições muito difíceis para salvar um grupo de montanhistas em apuros. “Limpávamos a neve, quando olhavamos para trás, já não se viam as nossas pegadas”. Foram obrigados, depois de horas a caminhar sobre o manto branco, a parar num abrigo de pastores. “Partíamos o gelo, cortavamos a lenha verde e procurávamos acender o lume lá dentro”. Conseguiram secar as roupas até ao limite do confortável quando a neve começou a derreter com o calor e os voltou a encharcar. Já de dia, passaram o Pico da Nevosa e encontraram-nos a cerca de 1.500 metros, numa zona conhecida por Lamelas. “Graças a Deus as coordenadas deles estavam certas e os encontrámos, se estivessem erradas tinhamos de vir embora. Aquilo ali não é para todos”. Para escapar às exigências do Parque Nacional da Peneda Gerês, a maioria dos que se aventuram ali não se acusam. “Ninguém sabe quantas pessoas andam a atravessar a serra ao fim de semana. Vai continuar a haver acidentes e resgates”, explica José Carlos.
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Contorno a albufeira da Paradela e meto-me na estrada sinuosa que contorna a montanha até às bandas de Cabril. Largo-a perto de Cela para descer por um caminho em terra batida até às cascatas de Cela Cavalo, um oásis de frescura junto ao Rio Cávado. O Barroso não para de me surpreender. “Aí para cima tem mais quedas de água”, explica-me maravilhado um visitante, “ é só subir”.
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Já cai o final da tarde. Acumulam-se nuvens sobre o território de perigo e adrenalina em pedra que me descreveu José Carlos. Ouve-se o som ainda precoce do que virá a ser uma valente trovoada dentro de uma, duas horas. Daí a pouco a chuva lava o asfalto da estrada que atravessa o interminável concelho de Montalegre.
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CELA

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